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Pânico, desamparo e psicanálise

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Dizem que somente quem já viveu uma crise de pânico sabe como é, dadas as dificuldades de se descrever em palavras o grau de angústia e sofrimento físico envolvidos. No contato com quem sofre do transtorno nós, psicanalistas, procuramos nos aproximar de sua experiência e fazê-lo reconhecer os sintomas e nomear os sentidos que deles advêm. Como isso pode ser feito? Veja abaixo o interessante artigo da psicanalista e membro da SBPSP, Norma Lottemberg Semer, sobre o tema.

Por Norma Lottemberg Semer*

O transtorno do pânico

Descrito pela psiquiatria contemporânea oficialmente desde 1980, quando apareceu no Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais (o DSM), o transtorno do pânico é também citado no Código Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (o CID-10), publicado pela Organização Mundial de Saúde.

O transtorno do pânico caracteriza-se por um período de intenso temor ou desconforto no qual quatro dos seguintes sintomas surgem abruptamente: palpitações ou ritmo cardíaco acelerado; sudorese; tremores ou abalos; sensação de falta de ar ou sufocamento; sensação de asfixia; dor ou desconforto torácico; náuseas ou desconforto abdominal; sensação de tontura, instabilidade, vertigem ou desmaio; desrealização (sensação de irrealidade) ou despersonalização (estar distanciado de si mesmo); medo de perder o controle ou enlouquecer; medo de morrer; anestesia ou sensação de formigamento e calafrios ou ondas de calor.

O pânico é uma reação de ansiedade em relação a sensações do próprio corpo. Enquanto nas fobias a pessoa sente ansiedade em relação a um objeto externo, no pânico ela fica ansiosa frente ao que sente em seu próprio corpo. Esta é uma das características centrais do pânico: os perigos vêm de dentro, vêm do próprio corpo, numa sensação de grande angústia.

Os sintomas sugerem que o indivíduo está sob ameaça de algo terrível, do qual precisa fugir, embora não haja perigo concreto aparente.

Em 1895, Freud descreveu a neurose de angústia nos mesmos moldes em que hoje é descrito o transtorno do pânico, com manifestações corporais e ataque de angústia, sem nenhuma representação psíquica, além de um sofrimento intenso. Freud assinala ser possível que o sujeito venha a recorrer “à interpretação que estiver mais à mão” (medo de morrer, loucura, crença no distúrbio de uma função corporal) como uma tentativa de configuração, de uma busca de explicação causal, que poderia reduzir sua angústia.

O transtorno do pânico pode parecer não possuir significado psicológico. Os ataques podem surgir “inesperadamente”, sem desencadeantes ambientais ou intrapsíquicos conhecidos. Por vezes a pessoa fala do pânico como algo totalmente alheio à sua experiência, à sua história, sem qualquer conexão com suas emoções ou com sua história de vida. Expressa-se como se tivesse uma virose ou sido contaminada por algo desconfortável, incômodo, estranho, alheio à sua pessoa.

Para a Psicanálise, entretanto, existe um sofrimento psíquico que precisa ser reconhecido, sobretudo pelo próprio paciente. É importante lembrar que Freud mostrou o desamparo como condição intrínseca do bebê humano ao lado da importância e da necessidade de um outro para que cada um de nós sobreviva e se desenvolva biológica e psiquicamente. Assim, o pânico corresponderia à angústia decorrente da percepção do desamparo e da impossibilidade de tolerar essa condição, algo sempre presente na experiência humana e não restrito aos tempos atuais.

Para o psicanalista, a tarefa seria levar o paciente a se envolver no seu sofrimento, a desenvolver interesse e curiosidade com o que acontece a si próprio, para que possa encontrar um significado nos seus sintomas.
Em geral os pacientes apresentam dificuldades frente à ameaça de perda de vínculos, intolerância às frustrações, dificuldade de pensar e conter seus estados emocionais, ao lado de fragilidade no senso de identidade pessoal e aspectos ligados à dependência.

O trabalho psicanalítico é uma experiência que pode auxiliar o desenvolvimento psíquico, expandir o mundo interno com maior participação de fantasias e de sentimentos. Assim, é possível que, ao longo do tempo, o paciente encontre outras formas de expressar e de lidar com seu sofrimento.

O objetivo do psicanalista é, então, despertar o interesse do paciente para seu próprio funcionamento psíquico, a partir de um encontro vivo entre duas pessoas que se comunicam. Por meio do acolhimento que ocorre nesta relação, espera-se que o paciente possa estabelecer vínculos mais consistentes consigo mesmo e com a vida.

*Norma Lottenberg Semer é psicanalista, membro associado da SBPSP, doutora em Saúde Mental e professora afiliada na UNIFESP.



Comentários

7 replies on “Pânico, desamparo e psicanálise”

Caio Eminho disse:

Fui vítima da Síndrome do Pânico e realmente percebo que sofro este medo do desamparo. Porém após o pânico que não sofro mais, sofro de Despersonalização isoladamente não só eu mas muitas pessoas, ela e a Desrealização assim como o pânico já são consideradas doenças CID.10 F48.1. Nunca achei um parecer psicanalítico profundo a respeito do tema,acredito que por dois principais fatores o primeiro de ser algo pouco conhecido e assim não ter um base boa para estudos e também por ser algo muito complexo.

Katia Dourado disse:

Estou me formando em psicologia e estou fazendo a minha monografia com o tema do Transtorno do Pânico porque gostaria muito de atender pessoas que sofrem com este Transtorno, se puder me ajudar, dada a sua experiência, gostaria que me indicasse artigos e referências pertinentes ao assunto. Desde já agradeço a sua colaboração.
Katia Dourado

Mariana pavani disse:

Muito bom texto. Pacientes com crises vivem com medo de novas crises. Elas são incapacitantes. Um trabalho em conjunto com psiquiatra pode ajudar muito.

Pedro Lira disse:

O filme pânico é um interessante e animado filme do gênero terror e um dos mais clássicos filmes do cinema mundial. Com o desenvolvimento anunciado originalmente em 2019, e tendo passado até mesmo por adiamentos por conta da pandemia de coronavírus, o filme retrata um assassino em série que, juntamente com a ajuda de outro psicopata, matam diversas pessoas da pequena cidade de Woodsboro usando mascaras do Ghostface. A obra de Kevin Williamson é uma digna obra prima do cinema de terror e merece a popularidade que teve.
Eu recomendo esses filmes para pessoas que se sentem confortáveis com a interação com sangue no filme e que não se incomodam com muita violência pois o filme Pânico se trata inteiramente de diversas mortes brutais e fatais do Ghostface.

Luis Conceição Escobar Lourenço disse:

Pessoal, li toda a matéria. Tenho minha esposa que tem Síndrome do pânico e Transtorno Afetivo Bipolar. Ela era catequista, agora não quer ir nem nas missas.A doença apagou a fé, já teve crises de medo de morrer, tem medo que falte comida, que falte luz. Faz 3 anos que Ela vem se tratando com Psiquiatra, Neurologista, psicólogo e há poucos meses iniciou um tratamento de Homeopatia. Caminhadas ‍♀️ não consegue fazer por que teve uma infecção no quadril. E ainda faz fisioterapia. Me ajudem.

Angela Brasil disse:

O livro A Síndrome do Pânico do autor Gugu Keller, poderá ajudar sua esposa no sentido dela reconhecer nele uma pessoa que sente as mesmas coisas que ela ,isso ajuda muito no processo do controle e diminuição das crises.

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